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Pandemia também afeta rotina de animais no zoológico do Parque Dois Irmãos

A onça preta parece mais triste sem a movimentação dos visitantes (Foto: Rômulo Chico/Esp. DP)

Local por onde circulavam 400 mil pessoas por ano segue fechado, sem previsão de reabertura

A interação com o público segue dando lugar ao silêncio no Parque Estadual Dois Irmãos, na Zona Norte do Recife. O tradicional zoológico, com 82 anos de história e mais de 14 hectares de extensão, permanece de portas fechadas para a visitação, desde o dia 17 de março de 2020. Até hoje, se mantém como a única atração cultural do segmento em Pernambuco que não reabriu, desde a chegada dos tempos difíceis trazidos pela pandemia da Covid-19. A nova rotina interfere no comportamento dos 380 animais que habitam no equipamento, instalado em um santuário de Mata Atlântica, bastante presente na memória afetiva da população. O atual cenário, com a ampliação das campanhas de vacinação, pode representar um sinal de esperança para um futuro de volta às atividades.

“A possibilidade de contaminação dos animais é uma situação real, diferente do que muita gente pode pensar diferente. Diante disto, nós tivemos que nos adaptar ao cumprimento de diversos protocolos de biossegurança para o contato nas jaulas, a manipulação de alimentos, acompanhamento de saúde, entre outros procedimentos”, explica o médico veterinário Márcio Silva, gestor técnico do parque. Segundo ele, até então não foi registrado o acometimento do vírus por nenhuma espécie, mas cerca de 30 profissionais tiveram que ser afastados ao primeiro sinal de sintomas, cumprindo o devido isolamento.

Mais de um ano depois, sem a costumeira movimentação diária entre crianças e adultos, algumas das 91 espécies do zoológico sinalizaram um pouco de mudança no comportamento. “Acreditamos que alguns animais que apresentavam um perfil mais interativo com os visitantes, como a onça, ursos e os macacos, passaram a mostrar sinais um pouco depressivos, como se estivessem entediados, sentindo essa falta dos humanos”, conta o veterinário. “A partir daí, passamos a intervir de maneira mais frequente com novos estímulos, procurando deixá-los mais confortáveis com a inserção de elementos que eles encontrariam na natureza”, contou. Segundo ele, as técnicas simuladas passam pelas atividades de caça, movimentação, inserção de mais vegetação e brincadeiras com peças lúdicas.

A caminhada pelas longas vias do parque, atualmente restrita aos biólogos, zootecnistas, tratadores e os demais membros do corpo profissional, tem agora como fundo apenas o som da floresta, com a presença das aves, mamíferos e répteis da fauna brasileira e do exterior. Esta nova vida de calmaria que interfere no ânimo de alguns, parece ser vista com bons olhos para outros. A remanescente ema do parque, com mais de 35 anos de idade, é uma das que tem aproveitado o cenário mais tranquilo. Não é diferente para o conhecido chipanzé Sena, prestes a chegar aos 64 anos e considerado o morador mais antigo do lugar. “Por ser idoso, ele parece mais sossegado. Talvez o antigo barulho possa remeter a lembranças não muito boas, como o seu passado no circo”, lembra o especialista.

De acordo com a Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas), que administra o parque, a maioria dos animais no Dois Irmãos chegou oriunda do fechamento de criadouros, apreensões de tráfico ilegal ou doações de excedentes de outros zoos. Conforme o órgão, alguns fazem parte da lista de animais que podem desaparecer da natureza. É o caso da Arara-boliviana ou o Mutum-de-bico-azul, hoje figurando no maior grau da escala de extinção. A bióloga Karol Gomes, que desenvolve ações no local, explica que o convívio com as rotinas dos animas se tornou mais fácil, desde que o parque fechou os portões. “Conseguimos realizar mais ambientações nos viveiros e dar um pouco mais de atenção às particularidades das espécies. Porém, toda a nossa rotina de educação ambiental para a população, uma parte importante do nosso trabalho, ficou prejudicada. O horto não era apenas para entretenimento”, ressalta, ao lembrar da paralisação de atividades como aulas, instruções, palestras, trilhas, entre outros. Para ela, a baixa na bilheteria, ao custo de R$ 5, também representa um panorama negativo, refletindo em menos recursos.

Chipanzé Sena, de 63 anos, demonstra aproveitar nova vida de sossego (Foto: Rômulo Chico/Esp. DP)

Para o zootecnista Rodrigo Pessoa, que atua na área de nutrição dos animais, a pandemia trouxe problemas com os fornecedores. Conforme ele, o parque continua com a necessidade de processar cerca de uma tonelada de alimentos por semana e de servir uma média de 100 refeições diárias. “Passamos a sentir dificuldades devido a escassez de alguns itens. Mas a dieta deles segue no mesmo caminho, com exceção de algumas lacunas”. Tais espaços podem ser encontrados quanto ao fornecimento de carnes, por exemplo, já que o zoológico já não conta com o famoso leão e ainda três tigres, todos mortos acometidos por câncer. “Tivemos que nos adaptar a um novo modo de operar, com alguns funcionários largando mais cedo e algumas alterações no horário de servir os animais”, contou.

Mesmo durante a crise gerada pela pandemia, as atividades rotineiras no cotidianos dos bichos puderam seguir. É o caso do nascimento, durante a pandemia, de três macacos-prego, veados catingueiros e cinco ararajubas. O trabalho faz parte do programa de conservação da biodiversidade. Atualmente, alguns animais seguem em tratamento no hospital interno do parque. É o caso da águia chilena, com alguns problemas nas asas devido ao alvo impiedoso de caçadores. A anta, com mais de 30 anos de idade, já não tem o mesmo pique, mas parece resistir com bravura aos tempos nebulosos trazidos pelo coronavírus

Local de boas lembranças pelo público pernambucano, por onde frequentavam mais de 400 mil pessoas por ano, o cenário hoje vazio demonstra certa tristeza e desolação. “A gente sente muita falta das pessoas, do movimento, da alegria que encontrávamos por aqui. Só resta o sonho com a hora de tudo voltar ao normal”, afirma o tratador Adelino Nascimento, de 30 anos. A popular praça de alimentação, marcada pelo movimentado restaurante e vários quiosques de comercialização de lanche, deu lugar a uma zona de esquecimento. Tudo foi deixado para trás, vitimado por uma pandemia que invadiu o lugar, sem pedir licença e ainda hoje traz bastantes prejuízos.

Não é diferente para quem precisava dos visitantes para sobreviver. Na esvaziada praça Farias Neves, bem diante da portaria, que conta com um exemplar de jardim do renomado arquiteto Roberto Burle Marx, a paisagem também é tristonha. Por lá, a comerciante Valderi Souza, 43, lamenta a situação. “De uma hora pra outra, passamos a conviver com a total ausência dos clientes e a falta de qualquer ajuda”, conta, lembrando que teve que interromper o fornecimento de almoços e a venda de peças artesanais, com uma redução na renda em torno de 90%. “Ninguém mais aparece por aqui”, reforça. O sentimento é compartilhado por Maria do Socorro Correia, 45, que conheceu o parque ainda criança e seguiu até os dias atuais. “Ao olhar todo este vazio é difícil segurar até o choro”, conta, mostrando a barraca fechada por falta de recursos.

Ao Diario, o governo do estado reiterou que ainda não existe data prevista para a reabertura do Parque Dois Irmãos. Conforme o órgão, o trabalho de elaboração de um plano de retomada, com todos os cuidados necessários, segue ainda em fase de elaboração.

Fonte: Diario de Pernmabuco

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Evandro Lira

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