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Silêncio nas arquibancadas, silêncio nas ladeiras: os torcedores de Pernambuco sem Carnaval

13 fev 2021|Postado em:RECIFE

 

Torcedores não desfilarão em 2021 – Foto: Arthur de Souza/Folha de Pernambuco

 

Blocos de torcedores, que costumam levar os sons das arquibancadas ao carnaval de rua, não serão realizados em 2021

Quando os foliões saíram às ruas no Carnaval do ano passado, ninguém imaginava que aquela festa seria a última em um bom tempo. Talvez tenha sido a última vez em que as torcidas do Trio de Ferro formaram uma aglomeração saudável e orgânica, sem preocupações relacionadas aos momentos dos clubes ou a resultados recentes. Importava somente a sinergia entre os torcedores, que cantavam e dançavam como se os clubes de coração fossem agremiações carnavalescas.

Os blocos de Carnaval alusivos às torcidas do Náutico, Santa Cruz e Sport arrastam multidões há anos e levam as cores e os sons das arquibancadas às ladeiras de Olinda. Em 2021, no entanto, a pandemia da Covid-19 vai fazer com que o silêncio que recentemente tomou as arquibancadas dos estádios de futebol seja reproduzido nos principais polos da Festa de Momo em Pernambuco.

Desde 2006, a Troça Carnavalesca Mista, Ofídica, Etílica e Erótica Minha Cobra, organizada por torcedores do Santa, leva milhares de foliões tricolores ao Carnaval de Olinda. Na manhã da segunda-feira, uma cobra gigante desfila pelas ruas e as colore de preto, branco e vermelho.

“O que tem motivado torcedores de arquibancada e foliões a organizar uma troça é o pertencimento. O ‘coralismo’ é um sentimento maior do que o futebol, então organizar esse tipo de festa é uma declaração de amor ao clube, à cultura popular e ao Carnaval. O Santa se entrelaça muito com a massa e, por isso, está muito próximo da cultura popular”, diz um dos membros da organização da Minha Cobra, o torcedor e folião Esequias Pierre.

Esequias também relaciona a liberdade das ladeiras às arquibancadas dos estádios em tempos passados. No Carnaval, é permitido fazer uma festa de um jeito que não se faz mais nos estádios. “A gente consegue levar bandeiras, papel picado, fazemos pirotecnia, temos a nossa orquestra e isso tudo representa a liberdade de torcer”, completa.

Um dia antes do desfile da Minha Cobra, o Sítio Histórico de Olinda também tem seus momentos de arquibancada. Nos domingos de Carnaval, a Troça Carnavalesca Futebolística e Cervejeira Eternamente Sport, fundada em 2016, leva os foliões rubro-negros às ladeiras.

O presidente da Troça, Renato Galvão, usa os versos que estão presentes no hino do clube para explicar a motivação dos torcedores-foliões em ir às ruas no Carnaval. “Nossa motivação é o amor pelo Sport Clube do Recife. Temos o clube como uma razão para viver e ele precisa fazer parte de todos os momentos das nossas vidas, não poderia ser diferente no Carnaval. Até a fundação da troça, o Sport não tinha um bloco em Olinda, mas tínhamos certeza que precisávamos trazer essa representação”, afirma.

Um pouco mais longe do furdunço das ladeiras estreitas do Sítio Histórico (mas com a mesma animação), está uma das manifestações mais tradicionais que relacionam o futebol e a folia de momo. Nos Aflitos, bairro da Zona Norte do Recife, alvirrubros e alvirrubras se reúnem há mais de 80 anos para celebrar o Timbu Coroado. Essa tradição, que se perpetua de geração em geração, também é motivada pelo amor ao Náutico. Mário Johnson, diretor social do Timbu Coroado, explica que os combustíveis que fazem com que a festa continue ano após ano são “a paixão pelo clube e o sentimento de profunda alegria em ver os torcedores e suas famílias, vibrando e brincando”.

Vazio, luto e precaução
Em 2021, no entanto, a alegria deu lugar à precaução. Pela primeira vez desde a sua fundação, a cobra gigante ficará guardada até a festa do ano que vem; as ruas de Olinda não serão mais pintadas de rubro-negro e os alvirrubros não poderão sair em bando pelo bairro dos Aflitos.

“É um sentimento de resignação. Entendemos que é necessário e essencial para o controle da pandemia, precisamos ter a importância de resguardar a vida das pessoas. Naturalmente, ficamos tristes por não poder levar a alegria que a gente tem levado àqueles que gostam da cobra e do Carnaval, de maneira geral. Mas a medida é necessária para que a gente possa, mais adiante, voltar às ladeiras de Olinda”, lamenta Esequias Pierre, um dos diretores da “Minha Cobra”.

A organização da troça chegou a elaborar alguns planos no fim do Carnaval passado. Mas, com a pandemia, o planejamento teve que mudar. Veio o desafio de ajudar os músicos e os trabalhadores que viabilizam os desfiles. Seria o 15º cortejo da cobra e, para não deixar passar em branco, a Minha Cobra manteve a tradição de fazer a camisa do ano e escolher um homenageado, que será Dirceu Paiva, responsável pelos cuidados da sala de troféus do Arruda. O dinheiro arrecadado com as vendas das camisas serão destinados aos 30 trabalhadores “que colocam a cobra na rua”, como diz Esequias. Outra parte do valor será destinado aos músicos da orquestra.

Pelas bandas dos Aflitos, o Timbu Coroado completa 86 anos em 2021. “Conseguimos resgatar o bloco atraindo uma multidão e este ano teremos que recolher o estandarte, mas ficar em casa é respeitar a vida e o próximo. Isso fará com que os alvirrubros, ano que vem, possam participar e vibrar, seguindo nosso Timbu Coroado e celebrando a vida”, afirmou Mário Johnson, diretor da agremiação.

Para que as torcidas possam voltar a festejar o amor aos clubes e esbanjar o sentimento de pertencimento pelas ruas de Pernambuco, é necessário que os foliões tenham consciência de que a pandemia não acabou. Haverá saudade, alguns reclamarão do vazio, mas decerto chegará o (arrebatador) momento de externar todo o sentimento que está guardado dentro de cada um.

 

Fonte: Folha de Pernambuco

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